Sobre a brevidade da vida | Mamãe Recomenda

5 de outubro de 2010

Sobre a brevidade da vida

“A vida é breve, longa, a arte.” Hipócrates


Não é curto o tempo que temos, mas dele muito perdemos. A vida é suficientemente longa e com generosidade nos foi dada, para a realização das maiores coisas, se a empregamos bem. Mas, quando ela se esvai no luxo e na indiferença, quando não a empregamos em nada de bom, então, finalmente constrangidos pela fatalidade, sentimos que ela já passou por nós sem que tivéssemos percebido. O fato é o seguinte: não recebemos uma vida breve, mas a fazemos, nem somos dela carentes, mas esbanjadores. Tal como abundantes e régios recursos, quando caem nas mãos de um mau senhor, dissipam-se num momento, enquanto que, por pequenos que sejam, se são confiados a um bom guarda, crescem pelo uso, assim também nossa vida se estende por muito tempo, para aquele que sabe dela bem dispor. (...)


viver
C.Albert / Aerial Dreams
Por que nos queixamos da Natureza? Ela mostrou-se benevolente: a vida, se souberes utilizá-la, é longa. Mas uma avareza insaciável apossa-se de, um de outro, uma laboriosa dedicação a atividades inúteis, um embriaga-se de vinho, outro entorpece-se na inatividade; a este, uma ambição sempre dependente das opiniões alheias o esgota, um incontido desejo de comerciar leva aquele a percorrer todas as terras e todos os mares, na esperança de lucro; a paixão pelos assuntos militares atormenta alguns, sempre preocupados com perigos alheios ou inquietos com seus próprios; há os que, por uma servidão voluntária, se desgastam numa ingrata solicitude a seus superiores; a busca da beleza de um outro ou o cuidado com sua própria ocupa a muitos; a maioria, que não persegue nenhum objetivo fixo, é atirada a novos desígnios por uma vaga e inconstante leviandade, desgostando-se com isso; alguns não definiram para onde dirigir sua vida, e o destino surpreende-os esgotados e bocejantes, de tal forma que não duvido ser verdadeiro o que disse, à maneira de oráculo, o maior dos poetas: “Pequena é a parte da vida que vivemos.” Pois todo o restante não é vida, mas tempo. Os vícios atacam-nos, e rodeiam-nos de todos os lados e não permitem que nos reergamos, nem que os olhos se voltem para discernir a verdade, mantendo-os submersos, pregados às paixões.(...)


(...)Vemos que chegaste ao fim da vida, contas já cem ou mais anos. Vamos! Faz o cômputo de tua existência. Calcula quanto deste tempo credor, amante, superior ou cliente, te subtraiu e quanto ainda as querelas conjugais, as reprimendas aos escravos, as atarefadas perambulações pela cidade; acrescenta as doenças que nós próprios nos causamos e também todo o tempo perdido: verás que tens menos anos de vida do que contas. (...)Os ocupados não tem tempo para refletir sobre si, daí o estranhamento de si mesmos. O homem, no entanto, pode ultrapassar sua condição meramente corporal e alcançar o conhecimento de si como alma e razão.(...)
morrer
Steve Argy

(...)Finalmente, todos concordam que um homem ocupado não pode fazer nada bem: não pode se dedicar à eloqüência, nem aos estudos liberais, uma vez que seu espírito, ocupado em coisas diversas, não se aprofunda em nada, mas, pelo contrário, tudo rejeita, pensando que tudo lhe é imposto. Nada é menos próprio do homem ocupado do que viver, pois não há outra coisa que seja mais difícil de aprender. Professores das outras artes, há vários e por toda parte, dentre algumas dessas, vemos crianças terem atingido tanta maestria, que chegam até a ensiná-las. Deve-se aprender a viver por toda a vida, e, por mais que tu talvez te espantes, a vida toda é um aprender a morrer.(...)
aprender
C.Albert / Aerial Dreams

(...)Dentre todos os homens, somente são ociosos os que estão disponíveis para a sabedoria; eles são os únicos a viver, pois, não apenas administram bem sua vida, mas acrescentam-lhe toda a eternidade. Todos os anos que se passaram antes deles são somados aos seus. (...)

 (...)É extremamente breve e agitada a vida dos que esquecem o passado, negligenciam o presente e receiam o futuro; quando chegam ao termo de suas existências, os pobres coitados compreendem tardiamente que (2) estiveram por longo tempo ocupados em nada fazer.(...)
 
espirito
C.Albert / Aerial Dreams
(...)Todos os maiores bens estão cheios de ansiedade, e as maiores fortunas são as menos dignas de crédito; para alimentar a felicidade, faz-se necessária uma outra felicidade, e em paga a uma promessa realizada, outras promessas devem ser feitas. Pois tudo o que nos sucede por obra do acaso é instável, e quanto mais alto nos elevamos, tanto mais estamos sujeitos a cair. É claro que o que está condenado a cair não agrada a ninguém. Portanto é necessariamente a mais miserável e não apenas a mais breve, a vida dos que obtêm com grande esforço algo que conservam com um esforço ainda maior. Em meio a grandes labutas, conseguem o que desejam e ansiosos conservam o que conseguiram; entretanto não têm consciência de que o tempo nunca mais há de voltar. (...)
Sobre a brevidade da vida - Sêneca


Leitura mais que recomendada, Sêneca foi um dos mais célebres escritores e intelectuais do Império Romano. Seguidor do estoicismo, que aconselha a indiferença  em relação a tudo que é externo ao ser, devendo assim manter a serenidade perante as tragédias e coisas boas. Para Sêneca, o destino é uma realidade. O homem pode apenas aceitá-lo ou rejeitá-lo. Se o aceitar de livre vontade, goza de liberdade. 

destino
Christel Arnod
Sobre a Brevidade da vida são cartas dirigidas a Paulino (cuja identidade é controversa), nas quais o sábio discorre sobre a natureza finita da vida humana. São desenvolvidos temas como aprendizagem, amizade, livros e a morte, e, no correr das páginas, vão sendo apresentadas maneiras de prolongar a vida e livrá-la de mil futilidades que a perturbam sem, no entanto, enriquecê-la. Escritas há quase dois mil anos, estas cartas compõem uma leitura inspiradora para todos os homens, a quem ajudam a avaliar o que é uma vida plenamente vivida. 

5 comentários:

  1. Uau! Que texto!
    Fiquei maravilhada. Tem que ser um profundo observador da vida humana para escrever um texto desses.
    Eu, quando bater as botas, vou tranquila porque sei que vivi e não apenas passei por aqui. Será que sou filósofa? rsrsrs
    Obrigada por compartilhar.
    abração
    Atena

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  2. Marcinha querida!
    Que belo post, minha amiga! Como sempre você nos dá um banho de cultura e qualidade literária! Esses dias estava assistindo Amor Sem Escalas (sei que você adora filmes...rsrs), com o lindérrimo George Clooney e em uma das passagens ele diz: "quanto mais lento caminhamos, mais rápido a vida passa". Estou hoje, inclusive, publicando um post que fala um pouco do que "aprendi" nesse filme. E fala sobre como nos arrastamos diante da vida, carregando pesos desnecessários. Acho que no final a vida se abrevia em sonhos e poucas realizações porque a preocupação não é com a vida em si e com o que ela pode nos ensinar...a preocupação acaba sendo com o quanto ela passa e nós nos arrastamos atrás dela.
    Acho que deu pra entender, né?
    Maravilhosa, como sempre!!! Sou sua fã mulher!!!
    Grande beijo,
    Jackie

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  3. Este comentário foi removido pelo autor.

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  4. Atena, mulher! Desculpe pela demora! Muito obrigadinha pela sua visita, eu fico muito feliz quando recebo um comentário seu!
    Eu adorei esse livro. Tenho me ocupado com uma leitura bem interessante... Quase lamentei meus anos assistindo E.R! Porque tenho tido a oportunidade de saber, que muitos sentimentos e questionamentos, que eu humildemente tenho, um cara há 2000 mil anos já teve! Eu não poderia descrever melhor esses sentimentos. E até tenho tido dificuldade para escrever, pois vi muita genialidade em palavras tão simples Como é difícil descomplicar o pensamento!!
    Minha querida, mais uma vez muito obrigada pela visita! Bjo enorme!

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  5. Jackie, minha querida! Eu recomendo que vc leia esse livro do Sêneca, é sua cara, viu? Uma leitura linda cheia de mensagens positivas e inspiradoras. Outro cara que ando apaixonada é Jung, putz! um espetáculo! No Scribd acho que tem todos os livros dele. E tem uns textos, que sou mais que fã, de uma ecritora, acho que vc conhece... Jackie Freitas... conhece? Então, esses eu recomendo para todo mundo tb!
    Minha linda, valeu a visita! bjo enorme, viu!

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